TRT-2 valida justa causa de porteiro que permitiu a entrada de assaltante

27 de outubro de 2025 - Por: Adriano Minozzo Borges,

TRT-2 valida justa causa de porteiro que permitiu a entrada de assaltante

A importância crítica do porteiro: guardião da segurança condominial
Em condomínios residenciais e comerciais, o porteiro desempenha um papel fundamental. Mais do que um recepcionista, ele é o primeiro elo da segurança, responsável por controlar o acesso de pessoas, identificar visitantes e zelar pela tranquilidade e proteção dos moradores e do patrimônio. A confiança depositada neste profissional é imensa e, por isso, sua conduta precisa ser pautada pela máxima diligência.

Mas o que acontece quando há uma falha grave nesse controle de acesso, resultando em um incidente sério? A demissão por justa causa é uma medida extrema no Direito do Trabalho, exigindo provas robustas e um ato faltoso inequívoco.

O Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (TRT/SP) proferiu recentemente uma decisão no Processo TRT/SP nº 1001420-24.2024.5.02.0059 que esclarece os limites da responsabilidade do porteiro e as condições para a aplicação da justa causa em casos de negligência na segurança. Nosso escritório analisou essa decisão para trazer um guia claro sobre o tema.

O caso: negligência de porteiro e assalto em condomínio
O caso em questão envolveu um porteiro que, atuando há menos de 15 dias em um condomínio residencial, foi demitido por justa causa após um grave incidente. Segundo os autos do processo:

  • Um furto ocorreu em uma das unidades residenciais do condomínio.
  • A investigação apontou que o porteiro havia autorizado a entrada de uma pessoa desconhecida.
  • O porteiro confessou em juízo que permitiu a entrada de um indivíduo que se identificou como morador, mesmo após interfonar para o apartamento supostamente habitado e não obter resposta. Horas depois, esse mesmo indivíduo foi visto saindo do condomínio com uma mochila, presumivelmente contendo os objetos furtados.

O porteiro buscou na Justiça a reversão de sua demissão por justa causa, alegando, entre outros pontos, que estaria em horário de almoço no momento do ocorrido e que o empregador também teria falhado ao não fornecer lista de moradores atualizada ou treinamento específico para o novo posto.

A Justiça de primeira instância havia reconhecido uma “culpa recíproca” (falha de ambas as partes), mantendo parte dos direitos rescisórios do empregado. Contudo, tanto o empregado quanto as empresas recorreram da decisão.

 

A decisão do TRT: A confissão como prova máxima e a manutenção da justa causa
Ao analisar o recurso, a Relatora, Desembargadora Dâmia Avoli, e a 16ª Turma do TRT/SP, deram total provimento ao recurso dos empregadores e negaram provimento ao recurso do empregado, validando integralmente a justa causa aplicada. A decisão se baseou em pontos fundamentais:

  1. A Confissão do Empregado: O ponto mais decisivo para a Justiça foi a confissão do próprio porteiro em juízo. Ele admitiu ter permitido a entrada de uma pessoa desconhecida, mesmo após ter interfonado e ninguém atender.
  2. A Gravidade da Negligência: A função precípua de um porteiro é o controle de acesso e a segurança do local. A conduta de permitir a entrada de um desconhecido sem a devida confirmação, especialmente após não ser atendido no interfone, foi considerada uma negligência de extrema gravidade.
  3. Responsabilidade do Empregador Afastada: O Tribunal também afastou a culpa do empregador que havia sido reconhecida na primeira instância:
    1. Treinamento: A Relatora entendeu que o treinamento específico para aquele posto não era necessário, pois o porteiro atuava na função há mais de dez anos. Sua experiência era considerada suficiente, e a necessidade de atenção era do empregado, não do empregador.
    2. Lista de Moradores: A ausência de uma lista de moradores atualizada foi considerada irrelevante, uma vez que o porteiro confessou ter liberado a entrada mesmo após o interfone não ser atendido. A falha ocorreu apesar da possibilidade de verificação, não por sua falta.
    3. Falta única de magnitude suficiente: A decisão reforça que uma única falta, desde que de tamanha magnitude, é capaz de ensejar a justa causa, mesmo que o empregado não tivesse punições anteriores em seu histórico.
    4. Imediatidade da Punição: O prazo de 15 dias entre o conhecimento do fato (08/07/2024) e a demissão (22/07/2024) foi considerado razoável para a apuração interna, afastando a alegação de “perdão tácito” (quando a empresa demora tanto para punir que se entende que perdoou a falta).

 

Consequências da Decisão para Empregadores e Empregados
O acórdão do TRT, ao validar a justa causa, teve as seguintes implicações:

  • Ação improcedente: A ação trabalhista do porteiro foi julgada improcedente.
  • Perda de direitos rescisórios: O porteiro perdeu o direito a verbas como multa do FGTS e diferenças de verbas rescisórias que seriam devidas em caso de demissão sem justa causa.
    Honorários advocatícios: Os empregadores foram desobrigados do pagamento de honorários advocatícios, e o empregado foi mantido como parte sucumbente (perdedora).
  • Danos morais: O pedido de indenização por danos morais feito pelo porteiro foi negado, já que sua demissão foi considerada legítima.

 

Lições Importantes para Condomínios, Empresas e Profissionais de Segurança

Esta decisão é um importante balizador para todos os envolvidos em relações de trabalho que exigem controle de acesso e segurança:

  1. Para condomínios e empresas contratantes:
    1. Protocolos claros: Mantenham protocolos de segurança claros e acessíveis para todos os funcionários, especialmente porteiros e vigilantes.
    2. Treinamento adequado: Embora o TRT tenha afastado a necessidade de treinamento neste caso específico devido à experiência do empregado, é fundamental garantir que todos os funcionários recebam treinamento adequado para as peculiaridades de cada posto de trabalho.
    3. Vigilância e fiscalização: Monitorem e fiscalizem a conduta de seus funcionários, especialmente em áreas críticas de segurança.
    4. Ação rápida e documentada: Em caso de incidentes graves, atuem rapidamente na apuração dos fatos e documentem todo o processo para subsidiar futuras decisões.
  2. Para Profissionais de Segurança (Porteiros, Vigias, etc.):
    1. Responsabilidade elevada: Entendam a natureza crítica de sua função. A segurança de pessoas e patrimônios depende diretamente de sua diligência.
    2. Adesão aos protocolos: Sigam rigorosamente os protocolos de segurança e de controle de acesso. Na dúvida, sempre priorizem a segurança e, se necessário, neguem o acesso ou acionem a supervisão.

 

Conclusão: segurança é prioridade, e a negligência tem consequências legais
A decisão do TRT/SP reafirma que a negligência em funções de segurança, especialmente quando resulta em incidentes como furtos, pode justificar a demissão por justa causa. A gravidade da conduta, a confissão do empregado e a clareza das responsabilidades inerentes ao cargo foram determinantes para a validação da penalidade máxima.

Para empregadores, é um lembrete da importância de ter políticas de segurança bem definidas e da possibilidade de aplicá-las com rigor em casos de falha grave. Para empregados, é um alerta sobre a seriedade e o impacto de cada ação no exercício de funções tão cruciais para a segurança coletiva.